domingo, 5 de agosto de 2007

Ontem
mais precisamente de madrugada
tive um sonho como num livro vi um poema de
começo meio e fim completar-se diante de meus olhos adormecidos
e atentos
instantâneos de simultaneidades
era um poema acabado inteiro fantástico
montagem de inversões conceituais inusitadas
armando o belo paradoxo que o fechava
tão inesperado quanto simples e correta a sua linguagem
sonhei depois
que me acordara do sonho do poema
quase nada retinha na memória
que sonhada fugia de esquecer-se
estranha num cubículo
mesmo assim tive a vaga impressão de que no texto corria
a mobilidade dos corpos na terra
o giro da terra no tempo
o tempo fluindo estático no poema
tudo pouco claro e sugerido
muito mais mostrado do que dito
não sei por que sinal ali implícito
lembrou-me o nome Galileu para o seu título
tinha entretanto perdido o achado
abatido pela fuga do poema
sonhei que adormeci novamente e novamente sonhei com o poema nele havia agora
uns motivos de juventude e outros encantamentos sociais
que não estavam - segundo o sonho - no primeiro
dessa vez fui mais profissional nas diligências da ilusão sonhei que ao despertar fui procurar um lápis e umas pílulas na falta de papel contentei-me com umas etiquetas de supermercado picotadas e pequenas como selos
escuras e sem brancos
aí anotei o poema
que não me escapou nem sequer pelas vírgulas
adormeci feliz tendo ao lado da cama sobre o criado-mudo
o troféu de meus combates com o sono
com as formas
com a noite
com os temas
lá estava enfim domesticado e vivo o poema dos meus sonhos
de manhã quando acordei
tinha esquecido tudo.

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